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30/05/10 Alteração nas postagens:
Ao criar o novo nome para o nosso blog, tive que passar todos os comentários do antigo para cá e por vezes errei, colei 2 vezes ou em lugar errado e tive que apagar. É por isso que está aparecendo que algumas postagens foram excluídas por mim. Pior: não consegui copiar os seguidores para este blog.
Desculpa, mas sou uma blogueira iniciante e errante.
Tânia

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segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Caso 14- Gestante, Tb pleural, co-infectada HCV

Motivo da discussão:

1- Qual o melhor momento para iniciar TARV em pacientes em tratamento para tuberculose e com imunossupressão severa? E na gestante, as orientações permanecem as mesmas?
2- Durante a gestação, há um risco maior de hepatite medicamentosa ou síndrome de reconstituição imune?
3- Que ponto de corte de hemoglobina deve-se utilizar para contra-indicarmos o uso do AZT na gestação?
4- Utilizar ou não EFV no primeiro trimestre da gestação? E o TDF?
5- LPV/r com dose aumentada do RTV é um esquema factível (na prática) quando não se pode utilizar EFV ou SQV/r?
6- Profilaxia para PCP na gestação deve ser feita com SMX/TMP?
7- Qual a idade gestacional ideal para iniciar ARV para profilaxia da transmissão vertical?
8- Quando iniciar TARV para esta paciente?

Caso:

Mulher, 31 anos, parda, casada, nivel de instrução superior, boas condicoes sócio-economicas.
Diagnostico de Aids em junho de 2010, durante internação hospitalar para investigação de quadro consumptivo. Na mesma ocasião, também foram diagnosticados tuberculose pleural e gravidez. Anti-HCV e HCV-RNA (PCR qualitativo) positivos.

HPP
: Sem outras infecções oportunistas ou doença definidora de Aids no passado.

Iniciado tratamento com esquema RIPE (coxcip 4) em 25/06/10. http://www.scielosp.org/scielo.php?pid=S0034-89102010000100022&script=sci_arttext

Encaminhada ao ambulatório em 15/07, na 9ª semana de gestação.
Primigesta. Sem história de tabagismo, etilismo, drogas ilícitas, assim como hemotransfusão, piercing e tatuagem. Parceiro HIV negativo. Sem outras comorbidades.
Trazia prescrição de ARV feita pelo infectologista que a acompanhou durante a internação: AZT+3TC+ABC. Estava em uso de tuberculostaticos (RIPE) há 3 semanas, além da profilaxia com SMX/TMP.
Bom estado geral, assintomática, negando efeitos adversos as medicações em uso. Exames realizados 1 semana após a alta hospitalar: CD4 – 134 cál/mm3, CV – aguardando resultado e Hb 9,0.
Em 01/07/10; perfis hepático, renal e lipídico sem alterações.

Precisa ser dicidido:

Qual esquema ARV utilizar neste caso, levando-se em conta que a paciente é portadora crônica de hepatite C, está no primeiro trimestre da gestação, com anemia importante e em uso de rifampicina?

Lembrar das dificuladades para adesão a terapia, já que, a paciente ainda toma 02 comprimidos de SMX/TMP + 04 comprimidos do coxcip 4 + 01 comprimido do polivitamínico.

18 comentários:

  1. Olá !

    Pessoalmente acho que uma boa opção seria trocar a TARV assim que tiver uma CV<50 para TDF+3TC+NVP.
    O HIV deve ser tratado imediatamente (CD4 134), assim como a tuberculose e isso possibilita o uso do esquema RHZE associado a SMX-TMP.
    Eu pessoalmente gosto de iniciar o esquema tuberculostático algumas semanas ou no máximo poucos meses antes do início da TARV.
    Com esse esquema podemos poupa-la do AZT, visto que talvez essa anemia ainda vá piorar um pouco em decorrência da gestação.
    Monitorar com cuidado a função hepática e em caso de alguma elevação de transaminases, a opção seria trocar a NVP por LPV/Rito e trocar o esquema RHZ por SEO, embora eu já tenha lido experiências boas com LPV/Rito com dose aumentada associada com Rifampicina.
    Acredito que o TDF ainda é "aceitável" na gestação, certo ? O FDA libera como risco B.
    Acredito que o tratamento da hepatite C pode ser postergado para depois do parto, até pela impossibilidade de uso de PEG-IFN e Ribavirina em gestantes.

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  2. Excelente caso.Quanto ao início da TARV a gestante estava com 9 semanas mas neste caso a indicação nâo se baseia na IG mas sim no CD4<200.Manteria o uso de AZT com controle rigoroso de hemoglobina pelo melhor benefício ao feto, mas caso notasse tendencia a queda substituiria pelo TDF.Quanto a sulfa acredito que não haja dúvidas sobre a necessidade.Quanto a Hepatite C , o baixo Cd4 contra-indicaria por si só o tratamento.O problem aqui é a terceira droga. Não me sentiria confortável em utilizar NVP , visto seu potencial de hepatotoxicidade natural associado ainda ao HCV , ao tratamento para TB ( hepatotoxico ) e a própria interação da NVP com a RMP. 3ITRN ou LPV/r + dose acrescida de RTV ? A substituição da RMP por Estrepto é viável mas não aconselhável creio eu...3ITRN apesar de apresentar falha mais precoce me parece mais saudável(neste caso)..Tive algumas poucas experiências com LPV/r + dose acrescida de RTV e em todas as vezes a replicação se manteve suprimida , mas não é uma conduta ainda efetivamente aprovada.Enfim ficaria tentado , bastante , ao uso de azt/3TC ( ou TDF/3TC ) + LPV/r + RTV mas acredito que acabaria por manter 3ITRN substituindo imediatamente este esquema ao término do tratamento para TB ( antes que falhe..)

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  3. Muitas perguntas- muitas considerações-
    Parte 1:
    1- Qual o melhor momento para iniciar TARV em pacientes em tratamento para tuberculose e com imunossupressão severa? E na gestante, as orientações permanecem as mesmas?
    As orientações para gestante ainda permanecem as mesmas, ou seja, TARV deve ser iniciado em qualquer gestante, independente dos sintomas e da contagem de células CD4.
    Neste caso, como tem indicação de TARV para a sua própria saúde, e não somente para profilaxia de transmissão vertical, o esquema deverá conter 3 drogas de duas classes diferentes. O tratamento deve ser iniciado, independentemente da idade gestacional e as profilaxias para IO estão indicadas se CD4<200 ou há evidência de doença.
    Nosso consenso não recomenda genotipagem pré-tratamento, ao contrário do que é recomendado em outros consensos internacionais (base para recomendação – A III). Pessoalmente, sempre que possível acho que o teste deva ser solicitado, em especial nas regiões onde é mais elevada a prevalência de resistência primária, como por exemplo, RJ (resistência intermediária OMS). Lembro que o início do tratamento não deve aguardar o resultado do teste de resistência. A escolha do esquema deve levar diversos aspectos em consideração e há um consenso muito didático do NIH que recomendo como um bom guia, além do nosso consenso- http://aidsinfo.nih.gov/contentfiles/PerinatalGL.pdf.
    A associação mais estudada em gestantes é AZT + 3TC e é, habitualmente, bem tolerada. Nossa paciente está na “zona no agrião”, com Hb de 9. Se estivesse com Hb 8, o uso do AZT estaria contra-indicado. No caso, podemos usar e monitorar. Ainda poderíamos usar eritropoitina, caso necessária.
    Lembro que é preciso pesquisar anemia ferropriva ou por carência de folato e fazer as reposições adequadas.
    Nosso consenso recomenda, no caso de impossibilidade de usar AZT, que este seja substituído por ddI EC ou d4T e aí MUITO cuidado com a toxicicidade mitocondrial.

    No caso de escolha de ITRNN, este deve ser a NVP. Há de se ter cuidado com a hepatotoxicidade que pode ocorrer em ~3 a 30% das gestantes em uso de NVP, ppte se tiver CD4>250. Não é o caso desta gestante, no momento, mas, apenas o tratamento da TB pode elevar seu CD4 já que, por transativação heteróloga do HIV, a TB pode elevar, transitoriamente, a CV e reduzir o CD4. Problema ainda maior vai ser associar o risco potencial da hepatotoxicidade da NVP e dos tuberculostáticos e a presença de vírus C que torna este risco ainda maior. Eu acho que não usaria NVP para esta paciente.
    Se não estivesse com TB, a recomendação do nosso Consenso em Gestantes seria LPV/r.

    Não temos mais NFV no Programa Nacional, mas, esta é uma droga considerada como alternativa terapêutica por seu longo período de observação em gestantes em todo o mundo.

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  4. Parte 2 -

    Fatos- tem TB, está grávida, tem hepatite C (que ainda não traz, no relato do caso evidência que comprove ser crônica). A melhor opção para o momento seria AZT + 3TC + ABC que seria alterado quando terminasse o tratamento da TB. Seria ótimo se pudesse pesquisar HLA*5701. Sonhar não custa nada.Não dá pra fazer IFN na gestação e, assim, deixemos para depois a hepatite C.

    2- Durante a gestação, há um risco maior de hepatite medicamentosa ou síndrome de reconstituição imune?
    Reconstituição imune- há uma coorte da Johanesburgo com 423 incluídos dos quais 21% eram gestantes. Não encontrei referência de maior risco de IRIS entre as gestantes http://www.medscape.com/viewarticle/575815_3

    Há vários relatos casos de reconstituição na gestação, mas todos isolados. Se alguém tiver uma referência de relação entre gestação e IRIS, favor enviar ao grupo.
    A incidência de fígado gorduroso agudo na gestação, culmonando em falência hepática aguda é de 0,008% (tipicamente no terceiro trimestre, com pré- eclampsia em 50%). http://emedicine.medscape.com/article/177354-overview

    Pode ser que haja uma associação entre injúria hepática na garvidez, disfunção mitocondrial e stress oxidativo. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/20034024

    3- Que ponto de corte de hemoglobina deve-se utilizar para contra-indicarmos o uso do AZT na gestação?
    =<8- contraindicado ; =<10 monitorar com frequencia.

    4- Utilizar ou não EFV no primeiro trimestre da gestação? E o TDF?
    O EFV está contra-indicado por efeitos teratogênicos e ainda não é liberado em nenhum consenso, mas parece que vai haver alguma mudança devido aos resultados de uma metanálise publicada por Ford e cols que comparou as taxas risco de defeitos congênitos em 1132 nascidos vivos de mães expostas ao EFV no primeiro trimestre da gestão e 7163 de mães não expostas e não encontrou diferenças entre os dois grupos ou a população geral- http://fieldresearch.msf.org/msf/bitstream/10144/99413/1/Ford%20AIDS%202010%20EFV%20pregnancy.pdf.

    Os dados sobre uso de TDF na gestação ainda são limitados em relação a efeitos potenciais sobre os ossos e só deverá ser utilizado caso uma opção mais segura não esteja disponível.


    5- LPV/r com dose aumentada do RTV é um esquema factível (na prática) quando não se pode utilizar EFV ou SQV/r?
    Ainda não há dados suficientes para uma recomendação formal de ajuste de dose para 3 cp 2 x dia de LPV/r no terceiro trimestre da gestação.

    6- Profilaxia para PCP na gestação deve ser feita com SMX/TMP?
    Sim http://www.cdc.gov/mmwr/pdf/rr/rr5804.pdf
    É bom ter em mente que SMX + TMT tem elevada concentração fetal e são descritas fendas-palatinas em animais.
    Folato também é importante na formação do tubo neural, mas, lembro, já que vai fazer SMX + TMT, a reposição de folato deveria ser com ác. folínico e não fólico.

    7- Qual a idade gestacional ideal para iniciar ARV para profilaxia da transmissão vertical?
    Assintomática com CD4=>350 – semana 14 a 28. Tem um quadro ótimo na pág 58 do Consenso para Gestante 2010.

    8- Quando iniciar TARV para esta paciente?
    O início de TARV precoce durante o tratamento da TB, aumenta os riscos de efeitos adversos tanto dos ARV quanto dos tuberculostáticos e aumenta também o risco de síndrome de recuperação imune. Até o momento, o recomendado é o início da TARV, de modo geral, após 30 dias de início da TARV. Precisamos avaliar, tratando-se de gestante, risco/benefício de só iniciar TARV 30 dias após o início do tratamento para TB.

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  5. Ola Tania,

    Supus que a hepatite C fosse cronica devido ao fato de ela estar casada ha 3 anos (negando relaçoes sexuais extra conjugais) e seu esposo ser HIV/HCV negativos. Como ela nao tem historico de HTF, uso de drogas ilicitas, acidente com material biologico, piercing/tatoo ou outros comportamentos de risco, acreditei que a aquisiçao das infecçoes por HIV/HCV foi pela via sexual com algum outro parceiro, antes do casamento, ha pelo menos 3 anos...

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  6. Bom dia Isabella
    É, relamente,pertinente sua hipótese. Importante lembrar que é crescente a preocupação com a contaminação sexual do HCV. Vou mandar um artigo pra o grupo que li recentemente. Seria interessante fazer US com dopller.Os últimos exames que vc mandou foram de 01/07. É provável que já tenha outros.Também já deve ter iniciado ter iniciado ARV. Foi AZT +3TC + ABC? Como esla está?

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  7. Oi
    Eu iniciaria 1o. RIPE com quimioprofilaxia 1a. p/ PCP, A-ANÊMICOS e +/- 3 semanas depois 3TC/TDF/LPV'r com avaliações clínico laboratoriais semanais.
    Não análogos não são indicados devido à teratogenicidade de um e hepatotoxicidade do outro.
    A falta de comodidade posológica, acredito, não seria impeditivo, pois a paciente é esclarecida e sabedora da gravidade do seu quadro.
    Não descartaria ainda a hipótese de acompanhamento hospitalar c/ equipe multiprofissional (ginecoobstetra/hepatologista/infecto)num 1o. momento.

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  8. Boa noite todos:
    A recomendação de TARV na gestante com TB sem história prévia de tratamento é AZT + 3TC + ABC. LPV/r é uma opção para gestantes multiexperimentadas em TARV- Consenso para Gestantes 2010
    Tânia

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  9. 1- Nesse caso o que menos deverá ser avaliado, de início, é a coinfecção pelo HCV. O dado infecção pelo HCV norteia apenas para a possibilidade de maior hepatotoxicidade pelos tuberculostáticos e antirretrovirais.
    2- O tratamento do HCV é contra indicado principalmente pelo uso da ribavirina e não do interferon. A ribavirina é teratogênica. Engravidar só após seis meses do tratamento, pelo menos. E se fosse infecção aguda... Sem chance!
    3- Paciente HIV e tuberculose independente se grávida ou não. Tratar primeiro a tuberculose e iniciar as profilaxias.
    4- Gestação e antirretrovirais. Realmente nos preocupamos, e muito, com o feto, mas o tratamento é na mãe. No Caso vamos nos preocupar primeiro em reduzir a carga viral e restabelecer o sistema imune, mas de preferência com drogas que não interfiram com o feto. Profilaxia para transmissão vertical está ocorrendo de forma cada vez mais tardia (no terceiro trimestre). Só que no caso, tem que tratar a paciente. Além disso, tento não ficar trocando os antirretrovirais considerando os eventos adversos, tento controlar antes de trocar. A literatura vem mostrando um bom perfil do efavirenz na gestação no que diz respeito a teratogenia. Tenho acompanhado mulheres que engravidaram em vigência do efavirez e graças a Deus, sem problemas. Não tenho registrado o numero de gestante e o desfecho, é puramente da minha experiência e observação. Mas, isso vem de encontro ao que venho lendo na literatura (dados do efavirenz em gestante).
    5- Quanto ao AZT, com certeza ainda é o melhor medicamento usado na gravidez. Eu não contra-indicaria o uso pela Hg de nove. Da pra acompanhar, mesmo porque, essa Hg pode se elevar ou ficar mantida com o tratamento da tuberculose e do HIV.
    6- A forma de transmissão do HCV nesse caso, pra mim, não importa muito. É ideal comentar e reforçarmos muito a possibilidade da transmissão sexual, o que pra muitos parece não ser uma via tão importante. O interessante é que muitas vezes a transmissão do HCV parece ser por obra e graça do Divino Espirito Santo!
    7- Quanto à conduta na paciente:
    Iniciaria o RIPE tratando a Tb. Observaria os prováveis eventos adversos (EA) e melhora do estado geral, podendo até mesmo esperar umas três semanas (assim a paciente sairia do primeiro trimestre). E faria AZT + 3TC + EFZ. Acompanhando bem de perto os EA. Se a carga indetectar, ótimo. Se não, ai genotipar e avaliar novo esquema. Qual? O mais compatível com o RIPE. Podemos discutir o LPV/r, o SQV/r, ... No meu entendimento, se equilibrarmos a mãe, a prevenção da transmissão vertical será contemplada. Também podemos discutir as melhores drogas para prevenção da transmissão vertical, mas acho muita coisa para escrever. Não sou a favor de substituir o RIPE. Só se não tiver jeito.
    Quanto ao TDF, os levantamentos vêem mostrando não haver tanto problema. Mas, todas essas drogas são realmente recentes para termos certeza do dano real por elas provocado.
    Regina

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  10. Oi pessoal,

    Confeco que fico preocupada com a interação medicamentosa entre a rifampicina e os antirretrovirais, a ocorrência de IRIS, sobreposição dos efeitos adversos de ambas as terapias e a ingesta do grande numero de comprimidos quando ambas as infecções são tratadas concomitantemente. Esse receio, entretanto, não me leva a postergar o inicio da TARV para depois do final da terapia para TB, mas especialmente neste caso, tive uma preocupação maior em “quando iniciar a TARV”, por já ter experimentado as dificuldades associadas ao manejo das toxicidades e da IRIS durante a gestação. Mesmo não tendo evidencias de que essas intercorrencias ocorram com mais freqüência durante a gestação, nem que o manejo das mesmas e realmente mais difícil neste período, optei por não iniciar a TARV na primeira consulta. Aguardaria a paciente completar 12 semanas de gestação (entrar no 2º trimestre) e 6 semanas de RHPE. Geralmente, costumo iniciar a TARV entre 4 a 6 semanas após inicio da terapia para TB, pois considero este tempo razoável para observar o surgimento de efeitos adversos e aproveito para repetir os exames laboratoriais de hematologia e bioquímica, em busca principalmente de hepatite medicamentosa. Neste caso onde a paciente e, muito provavelmente, portadora crônica de hepatite C, farei exames com uma periodicidade maior.

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  11. Um dia desses, fiz uma brevíssima revisão da literatura a respeito desse primeiro ponto: Qual o melhor momento para iniciar TARV em pacientes coinfectados HIV/TB?
    Vi que os estudos clínicos mostram que a sobrevida e maior naqueles que iniciam o tratamento da TB primeiro, seguido pela TARV assim que possível. No SAPIT [1], o inicio da TARV durante a terapia para TB foi associado com 56% de reducao no risco de morte versus inicio da TARV apos o final da terapia para TB, mas a terapia “integrada” também foi associada com incidência maior de IRIS. Para a OMS, nos pacientes coinfectados HIV/TB, a TARV deve ser iniciada dentro das primeiras 08 semanas após o inicio da terapia para TB [2]. Entretanto, o melhor momento para iniciar a TARV durante essas 08 semanas parecia ainda não estar bem estabelecido. Recentemente, foi apresentado o estudo CAMELIA [3], que comparou o inicio da HAART na semana 2 versus semana 8 da terapia para TB. O inicio precoce na semana 2 foi associado com redução significativa na mortalidade versus inicio tardio na semana 8 em pacientes com CD4<200cel/mm3; o inicio tardio da HARRT aumentou a mortalidade em 52% em analise multivariada e a IRIS foi significantemente mais comum com o inicio precoce versus tardio da HAART.

    REFERENCIAS:
    1. Abdool Karim SS, Naidoo K, Grobler A, et al. Timing of initiation of antiretroviral drugs during tuberculosis therapy. N Engl J Med. 2010; 362:697-706.
    2. World Health Organization. Antiretroviral therapy for HIV infection in adults and adolescents. Recommendations for a public health approach: 2010 revision. Available at: http://whqlibdoc.who.int/publications/2010/9789241599764_eng.pdf Accessed July 23, 2010.
    3. Blanc FX, Sok T, Laureillard D, et al. Significant enhancement in survival with early (2 weeks) vs. late (8 weeks) initiation of highly active antiretroviral treatment (HAART) in severely immunosuppressed HIV-infected adults with newly diagnosed tuberculosis. Program and abstracts of the XVIII International AIDS Conference; July 18-23, 2010; Vienna, Austria. Abstract THLBB106.

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  12. A paciente retornou 03 semanas após a primeira consulta, na 12ª semana de gestação e 6ª semana de RHPE. Mantinha uso de SMX/TMP e polivitaminico, e ainda estava sem TARV. Clinicamente estável, sem queixas, inclusive negando disuria. Trazia novos exames, realizados em 22/07:
    CD4 - 115 (13,6%) e CV – 5.600;
    Hb 10,8, leuco 5.150, plaq 326.000, glic 88, ct 169 (HDL 53/LDL 96), tg 98, tgo 21, tgp 14, ggt 27, fa 50, pt 8,3, alb 3,3, ur 12, cr 0,4, na 133, k 3,6;
    SU- 6 pp/c e nitrito (-), urocultura – K. pneumoniae resistente a ampicilina e intermediaria para ampicilina-sulbactan, nitrofurantoina, cefuroxime, tetraciclina;
    FTA-ABS/ELISA para sífilis/VDRL – NR, AgHBs/Anti-HBc IgM e IgG/HTLV – NR, Anti-HCV – reagente, Anti-HBs – NR, Toxo/Rubeola/CMV IgM(-) e IgG(+). Aguardando genótipo e PCR quantitativo do HCV.

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  13. Gente,

    Esse blog eh muito bom mesmo! Ate portugues eu tou aprendendo, rs...

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  14. Na ocasião da segunda consulta, minha preocupação em usar ou não o AZT não existia mais, pois a Hb estava acima de 10, apesar de na gestante, o ponto de corte da Hb para contra-indicacao do AZT ser 8,0 e não 10,0 (devido a hemodiluicao que ocorre naturalmente). Mas, caso a paciente ainda estivesse com Hb de 9,0g/dl, e não fosse possível seu monitoramento adequado, não iria utilizar AZT. Provavelmente, optaria pelo TDF, mas segundo nosso consenso de gestantes (versão preliminar 2010), as opções neste caso seriam ddI EC e d4T. Sei que os dados de TDF na gestação são mais limitados que outros ITRN, e que o mesmo so deve ser utilizado se não pudermos utilizar outra droga mais “segura”, devido aos relatos de turnover ósseo aumentado em animais durante a gestação, mas como sempre penso na toxicidade mitocondrial dessas drogas (ddI e d4T), me perguntei: se as gestantes tem maior risco de toxicidade hepática e pancreática com uso do ddI e d4T (inclusive acidose lática fatal pode ocorrer na gestação se ambas forem associadas), e essa paciente tem hepatite C crônica, isso não seria pior que uma possível restrição no crescimento do feto com o uso do TDF? De qualquer forma, parece que os dados mais recentes de estudos em humanos não mostram diferenças significativas neste aspecto (peso, comprimento, circunferência da cabeça) quando o TDF e utilizado durante a gestação, inclusive no Reino Unido, o TDF e droga de primeira linha tanto para o tratamento de gestantes quanto para a profilaxia da transmissão vertical. Para a OMS, no entanto, e droga de primeira linha apenas para a profilaxia da TV. Já nos Estados Unidos, ele entra como droga alternativa em ambas as situações. Ou seja, parece que estamos caminhando para a recomendação do uso do TDF na gestação, mas ainda precisamos de mais dados sobre os efeitos adversos sobre ossos.

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  15. Bem, depois que escolhi a dupla AZT+3TC, faltava decidir a 3ª droga... Como a paciente tem um ótimo nível de entendimento, expliquei todos os possíveis esquemas que ela poderia utilizar (com ITRNN e IP), juntamente com seus prováveis efeitos adversos e interações medicamentosas com a rifampicina. Falei ate sobre a possibilidade de utilizarmos esquema alternativo sem rifampicina (com estreptomicina) ou da TARV com apenas 3 ITRN (AZT+3TC+ABC, que e o esquema recomendado pelo consenso de gestantes para profilaxia da TV durante o tratamento da TB). Mas, como não fazemos genotipagem do HIV pré-tratamento, e não sabemos ao certo como anda a incidencia de resistência primaria aqui em nosso meio, achei um pouco arriscado fazer um esquema apenas com análogos, apesar da carga viral estar baixa e ainda termos muitas semanas antes do parto (nunca sei quanto tempo o resultado da genotipagem vai demorar para sair). Tambem não cogitei a possibilidade de utilizar NVP, já que ocorre redução de suas concentrações séricas quando esta é associada à rifampicina (chegam a oscilar entre 20 e 55%). Preocupada com a adesão, contamos quantos comprimidos a paciente teria que tomar se utilizasse SQV/r (12) ou LPV/r (10 a 12) juntamente com AZT+3TC (02), RHPE (04), SMX/TMP (02) e vitamina (01). Ela achou bastante difícil “organizar” todas as tomadas, especialmente porque trabalha em esquema de plantão, sem acesso a geladeira. Bem, iniciamos a conversa sobre o EFV, que teria uma comodidade posológica bem melhor e não tem interação medicamentosa com a rifampicina. Porem, ela já sabia que poderia ser teratogênico, pois o outro medico já havia lhe “explicado tudo”. Mesmo assim, preferi fazer uma explicação rapidinha sobre o periodo de embriogenese, dizendo que o fechamento do tubo neural ocorre em torno do 26º ao 28º dia, e o fechamento das estruturas orais em torno do 36º dia, etc. Dessa forma, a “possível” mal formação do SNC associada ao uso do EFV já não era tão preocupante assim, pois a paciente estava com 12 semanas de gestação. E para deixa-la mais tranquila, falei sobre a recente revisão sistemática e metanalise do Ford e cols, que a Tania já citou anteriormente, onde não foi observado prevalência maior de defeitos congênitos com o uso do EFV no primeiro trimestre quando comparado com outros ARV ou com a população geral. Finalmente, juntas (a paciente e profissional de saúde), decidimos iniciar a TARV com AZT+3TC+EFV, na 12ª semana de gestação.

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  16. Sei que já “falei” demais, mas como agora me sinto mais a vontade nesse blog (e eu sempre falo muito mesmo), vou fazer meu ultimo comentário: apesar de ter solicitado genótipo e carga viral do HCV, assim com USG do fígado, não estou levando em consideração o tratamento do HCV durante o gestação, mesmo que tivesse evidencia que a infecção fosse aguda, tendo em vista todos os efeitos adversos do interferon e da ribavirina, principalmente porque esta ultima e teratogênica. So queria ter uma idéia do que realmente esta acontecendo... Meu maior receio sempre foi de não causar uma descompensacao hepática durante essa gravidez. E quando tiver novos resultados de exames ou alguma outra novidade desse caso, colocarei aqui no blog.
    P.S.: Tania, queria agradecer a você pela oportunidade de estar sempre disposta a publicar e discutir as nossas duvidas, e também aos colegas que comentaram o caso. Voces me ajudaram bastante! E para aqueles que ainda estão com vergonha de comentar ou de mandar os seus casos (como eu estive ate um dia desses), recomendo que façam isso logo, pois e muito legal. A gente sempre aprende muito quando divide as duvidas e os conhecimentos. \0/

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  17. Isabella:
    Muito obrigada pelo seu restorno. Me estimula a continuar. Se houver qualquer novidade não esperada no caso, nos mantenha informados.
    BJ
    Tânia

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