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Como não só médicos, mas outros profissionais de saúde estão envolvidos no tratamento dos pacientes portadores de HIV/AIDS, formalmente estão sendo convidados a participar das discussões, enviar casos e dúvidas. Para enviar um caso ou uma dúvida, clique no final de um caso, em comentário, mesmo que não seja diretamente relacionado a ele. Será visto pela adminstradora do blog e será publicado. Se não tiver uma identidade das listadas, publique como anônimo.

Ao publicar este blog minha intenção é criar uma rede de médicos que, por meio da discussão de casos clínicos, possam atender ainda melhor seus pacientes. As dúvidas também podem ser transformadas em situações hipotéticas sobre as quais poderemos debater. Todos os interessados são bem vindos.

30/05/10 Alteração nas postagens:
Ao criar o novo nome para o nosso blog, tive que passar todos os comentários do antigo para cá e por vezes errei, colei 2 vezes ou em lugar errado e tive que apagar. É por isso que está aparecendo que algumas postagens foram excluídas por mim. Pior: não consegui copiar os seguidores para este blog.
Desculpa, mas sou uma blogueira iniciante e errante.
Tânia

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domingo, 10 de abril de 2011

Caso 32- gênero masculino, quadro reumatológico

Motivo da discussão:

1- As manifestações reumáticas do paciente podem ter sido relacionadas ao HIV?
2- O tratamento antirretroviral deveria ter sido implementado desde o início do quadro?
3- A possibilidade de síndrome retroviral aguda pode ser avantada?


Caso:

Paciente do gênero masculino, 30 anos, atleta profissional.

Primeiro atendimento em 12/2009 com história de que 2 meses antes começou a ter dor no tornozelo esquerdo e a seguida por dor no tornozelo D. Procurou ortopedista que achou tratar-se de tendinite e medicou com antiinflamatório. Depois desta consulta fez uma viagem de 10 horas, ficou com edema de pés e surgiu dor no joelho. Foi medicado com corticóide, com melhora do quadro álgico e do edema, mas tinha rigidez matinal. Usou 7 a 8 dias de corticóide. Logo que interrompeu a medicação voltou a ter dor. Foi ao ortopedista que, desta vez, diagnosticou fascite plantar. Foi medicado com antiinflamatório. Além dos tornozelos e joelhos, agora tinha também lombalgia que motivou dois atendimentos em emergência hospitalar. O ortopedista o encaminhou para o reumatologista e foram feitos exames, inclusive o anti- HIV, que foi positivo. Durante o período de dor apresentou febre por 2 semanas, noturna, chegando a 38C. No momento desta consulta queixava-se de artralgia de interfalangeanas distais, com edema, mas, sem rubor, artralgia interfalangeana proximal de terceiro e quarto quirodáctilos direitos, dor nos calcanhares. Negava febre depois da já descrita anteriormente. Em uso de corticóide e metotrexate.

HPP: Lesão verrucosa por HPV região perianal. Anti HBc e Anti HBs positivos.
Antecedentes cirúrgicos: postectomia, correção cirúrgica de ruptura de ligamento de joelho esquerdo, retirada cirúrgica de lesão perianal por HPV.

H Fam: NDN

H Soc: HSH, não fumante, não usuário de drogas. Prática de exercícios físicos diários por até 6 a 8 horas.

Ao exame, aumento do volume das interfalangenas proximais de segundo e quarto QDD.
Aumento do volume das interfalangenas proximais de segundo e quarto PDD. Sem calor ou rubor. Dor a palpação.

Exames complementares:
11/10/09 Hem 5270000 Hb 14,3 Ht 43,7 VGM 82,9 HGM 27,1 CHGM 32,7
Leuc 10200 0/0/0/0/3/66/24/7 plaq 395000
EAS- normal
11/10/09 TC pelve- normal; TC abdome - normal
14/10/09 Hem 4470000 Hb 12,5 Ht 36,6 VGM 81,9 HGM 28 CHGM 34,2
Leuc 8000 1/1/0/0/70/20/8 Plaq 284000 VHS 77
FA 102 TGO 12 TGP 19 GGT 31
Ptns 7,3 Alb 37,6% Gama 31% ( 10,6 a 18,8) Alfa 1 7% (3,8 a 7,4) Alfa 2 11,2% ( 7 a 10,9%) Beta 13,1 % (8,9 a 14,4)- hipergamaglobulinemia policlonal.
Fator reumatóide 16,7 UI/ml (até 15); FAN neg; Ptn C reativa US 13 mg/dl ( até 0,3 )
IgG e IgM Chlamydia soro - neg ; Imunofenotipagem para HLA - B27 40,9% ( indeterminado)
13/10/09 Anti HBs 270 Ui/l Anti HBc + HbeAg neg Anti HBe + ; Anti HCV neg
21/10/09 Waller Rose - neg
23/10/09 Anti HIV + VDRL neg HBsAg neg
28/10/09 Ressonância magnética de sacro-ilíacas - normal.
05/11/09 Hem 4670000 Hb 12,3 Ht 37,3 VGM 79,9 HGM 26,3 CHGM 33
Leuc 8400 0/0/0/0/75/17/8 Plaq 340000 VHS 92mm
U 40 Creat 0,71 e-TFG > 60 G 83 Ferritina 494 ng/ml (22 a 291) FA 130 TGO 20 TGP 21 GGT 26
FTA-ABS IgG e IgM neg ASO 506 UI/ml PCR US 4,78 mg/dl ( até 0,3 mg/dl)
IgM CMV + IgG CMV + IgG HAV neg IgM HAV neg Hemocultura neg
Pesquisa de antígeno C. neoformans - neg
CD4 214 - 15% CD8 942 - 66% CD4/CD8 0,23
RT-PCR HIV 8892 cp/ml (3,95 log)
Pesquisa de N. gonorrhoeae em primeiro jato urina: neg
PCR para Chlamydia primeiro jato urina neg
Parasitol: cistos de Giardia intestinalis.
EAS- D 1015 pH 7,5 PPD não reator
10/11/09 Mapeamento de Retina - normal

12/11/09 IgG HAV - neg IgM HAV - neg
CD4 443 - 15% CD8 1741 - 59 % CD4/CD8 0,25

10/12/09 Reduziu ontem o corticóide para 15-10 mg e hoje 10-10mg. Mantinha metotrexate 2,5 mg. Ainda com artralgia leve, com rigidez matinal.
Trouxe exames de 02/12/09
Hem 4950000 Hb 14,1 Ht 40,5 VGM 81,8 HGM 28,5 CHGM 34,8
Leuc 7100 0/1/0/0/54/36/9 Plaq 193000
RT-PCR HIV 113821 cp/ml (5,06 log)
CD4 741- 49% CD8 1252 - 49% CD4/CD8 0,59
27/01/10 VHS - 24mm FR <11 Waller - Rose - neg
PCR US 0,84 mg/dl (até 0,3mg/dl)

5 comentários:

  1. Infecção aguda pelo HIV-1 é uma síndrome muito heterogenia e quando os sintomas são mais graves e por um período mais prolongada há uma tendência de progressão mais rápida. Os sintomas da infecção aguda, descritos primeiramente por Cooper em 1985, são mononucleose-simile. Artralgia e mialgia ocorrem com uma freqüência que pode ser superior a 50%. Nosso paciente, apresentou, além do quadro articular, febre (que ocorre em até 80% das infecções agudas sintomáticas). Suas queixas surgem em out/2009 e logo em novembro está com CD4 214 - 15% CD8 942 - 66% CD4/CD8 0,23; CV HIV 8892 cp/ml (3,95 log). Neste momento já estava em uso de imunossupressores. No exame seguinte em 12/11/09 CD4 443 - 15% CD8 1741 - 59 % CD4/CD8 0,25 e no seguinte CV HIV 113821 cp/ml (5,06 log) CD4 741- 49% CD8 1252 - 49% CD4/CD8 0,59. O paciente não havia iniciado tratamento antirretroviral. Parece pertinente a hipótese de infecção aguda pelo HIV. O início precoce do tratamento ainda é controverso e o paciente, até então mantinha-se apenas em uso de imunossupressores. Vamos ver como evoluiu.

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  2. Jan 2010- suspenso corticóide. Mantido Metotrexar 2,5 mg (5 cp 1 x semana) e Ac fólico 5 mg/semana.
    Fev/10 -Ainda com as mesmas doses de Metotrexate e ác fólico. Mantinha artralgia de interfalageanas proximais e metacarpo-falangenas, tornozelos, calcanhares. Rigidez matinal. Ao exame, aumento de volume da interfalangeana do segundo e quarto QDD e primeira e segunda metacarpofalangeanas da mão esq . Tornozelos sem aumento de volume, dor a palpação ou a mobilização.

    31/03/10 Hem 4740000 Hb 14,5 Ht 43,1 VGM 90,9 HGM 30,6 CHGM 33,6
    Leuc 5100 1/3/0/0/56/31/9 plaq 173000
    U 33 Creat 0,91 e-TFG > 60 PFH normais.
    VDRL neg
    RT-PCR HBV US- não detectado.
    RT-PCR HIV 33328 (4,52log)
    CD4 316 - 20% CD8 885- 56% CD4/CD8 0,36
    Antígeno Giardia neg (controle pós tratameneto)
    EAS- normal

    13/04/10 Iniciada TARV - AZT + 3TC + FPV/r

    10/05/10 Hem 4460000 Hb 13,5 Ht 39,8 VGM 89,2 HGM 30,3 CHGM 33,9
    Leuc 4500 0/1/0/0/34/51/14 Plaq 202000

    17/07/10 Hem 3520000 Hb 11,9 Ht 36,2 VGM 102,8 HGM 33,8 CHGM 32,9
    Leuc 4300 1/2/0/0/41/48/8 Plaq 239000 VHS 16
    Ptn C reativa titulada 0,29 mg/dl
    G 91 HBAlc 4,3 U 40 Creat 0,87 ác úrico 4,9
    Col 157 HDL 44 LDL 83 Tg 51 FA 82 TGO 23 TGP 15 GGT 7 BT 0,84 BD 0,25
    VDRL neg
    RT-PCR HIV <40
    CD4 425 - 21% CD8 1154- 57%
    Creat urina 0,071 Microalbumina 0,3 mg/dl
    Alb/ Creat 4,23mg albumina/g creatinina (até 30)
    EAS- normal

    03/08/10 TDF + 3TC + FPV/r (substituído o AZT porque caiu de 43 para 36 o Ht e queixava-se de cansaço aos esforços.

    26/08/10 Hem 4000000 Hb 13,7 Ht 39,1 VGM 97,8 HGM 34,3 CHGM 35
    Leuc 5800 0/3/0/0/47/42/8 Plaq 213000

    11/09/10 Densitometria óssea de coluna e fêmur proximal- normal. Coluna lombar- DMO de 1,167g/cm2. DMO equivalente a 100% da média de referência populacional de indivíduos de mesma faixa etária, com um Z-score de 0DP.Fêmur proximal D- DMO de 0,974g/cm2. Equivale a 95% da média de referência populacional Z- score de -0,4DP.

    20/10/10 Hem 4380000 Hb 14,2 Ht 41,8 VGM 95,4 HGM 32,4 CHGM 34
    Leuc 4300 0/3/0/0/48/41/8 Plaq 178000
    U 37 Creat 0,86 MDRD > 60 ác úrico 4,4
    Col 146 HDL 44 LDL 75 Tg 75
    EAS- D 1015 pH 6,5 Ptn traços
    CD4 441- 25% CD8 917 - 52%
    RT-PCR HIV <40
    Creat urina 0,138 Microalbumina 0,5 mg/dl alb/creat 3,62 mg albumina/g creat

    Out/10 Assintomático. Bem disposto. Suspenso metotrexate.

    Março/11 Início QP para TB (viragem PPD/ contao com TB)

    27/01/11 Assintomático.
    Hem 4750000 Hb 14,6 Ht 43 VGM 90,5 HGM 30,7 CHGM 34
    Leuc 7400 0/2/0/0/59/31/8 Plaq 237000 VHS 10mm
    G 89 HbAlc 4,4 U 32 Creat 1,07 MDRD >60 ác úrico 4,8
    Col 153 HDL 47 LDL 77 Tg 77
    FA 116 TGO 25 TGP 19 GGT 12 BT 0,25 BD 0,13
    Ca 9 P 2,6 PTH 31,4 pg/ml 25(OH) Vit D3 35,1 ng/ml
    Creat urina 24 h 0,149 g/dl Microalbumina 0,4mg/dl
    Alb/creat 2,68 mg alb/g creat
    PCR US 0,10 mg/dl
    RT-PCR HIV <40
    CD4 596- 26% CD8 1193- 52% CD4/CD8 0,50

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  3. Referências bibliográficas- agradecimentos penhorados ao Marcio Fernandes. São todas do Medscape
    http://www.medscape.com/viewarticle/514263?src=emailthis

    HIV-Associated Rheumatic Conditions

    http://www.medscape.com/viewarticle/703330?src=emailthis

    The Relation Between Symptoms, Viral Load (VL), and Viral Load Set Point in Primary HIV Infection (PHI)

    Primary HIV Infection–Predicting the Set Point

    http://www.medscape.com/viewarticle/559204?src=emailthis

    Prevalence of Primary HIV Infection in Symptomatic Ambulatory Patients

    http://www.medscape.com/viewarticle/562500?src=emailthis

    Primary HIV-1 Infection: To Treat or Not to Treat?

    http://www.medscape.com/viewarticle/510883?src=emailthis

    CROI 2009: Treating Primary HIV Infection Beneficially Changes Course of Disease

    http://www.medscape.com/viewarticle/588450?src=emailthis

    Therapy Insight: The Changing Spectrum of Rheumatic Disease in HIV Infection

    http://www.medscape.com/viewarticle/580802?src=emailthis

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  4. Nosso paciente iniciou o quadro em 10/09 com artralgia de grandes e pequenas articulações, rigidez matinal, febre por 2 semanas Fator reumatóide 16,7 UI/ml (até 15); FAN neg; Ptn C reativa US 13 mg/dl ( até 0,3 ); Imunofenotipagem para HLA - B27 40,9% ( indeterminado); Waller Rose neg; hipergamaglobulinemia policlonal; VHS 77; PCR US 4,78 mg/dl. Como já comentado, artralgia pode ser uma das manifestações da infecção aguda pelo HIV. Artrite reativa ( syndrome de Reiter) é mais comum e, em geral o HLA-B26 é positive. Nosso pacientes estava numa faixa cujo resultado foi considerado indeterminado o que não exclui o diagnóstico. O tratamento poderia ser feito por ARV para supressão da replicação viral e/ou antagonistas do fator de necrose tumoral.
    Infecção aguda por HIV, em geral, aparecem 2 a 6 semanas após a exposição e os sintomas podem se acomanhar de leucopenia e elevação das transaminases (ausentes no nosso caso). Os sintomas e a evolução dos níveis de linfócitos CD4 e da CV são a base para a considerar o diagnóstico de fase aguda de infecção. Em 05 de novembro 2011, logo após o início dos sintomas seu CD4 chegou a 214/mm³ e a CV era de 8892 cp/ml (3,95 log). O segundo exame foi feito 1 semana após e o CD4 estava em 443/mm³ ( embora em ambos os exames representassem 15% dos). Em 10 de dezembro, ainda sem uso de ARV, RT-PCR HIV 113821 cp/ml (5,06 log) e CD4 741- 49%. Desde o início do quadro vinha em uso de antiinflamatórios, inicialmente não hormonais e depois, corticóide e metotrexate, tendo havido melhora progressiva do quadro articular. Permanece desconhecido se o tratamento da infecção aguda pelo HIV resulta em benefícios imunológicos, virológicos ou clínicos em longo prazo. Poderia ter sido uma opção o início do ARV, de acordo com o médico assintente e desejo do paciente. De qualquer modo, o paciente foi acompanhado clínica e laboratoriamente a intervalos curtos e a decisão de início de TARV ocorreu quando estava com CD4 316 - 20% e CV de HIV 33328 (4,52log). Nesta ocasião já havia sido suspenso o corticóide e o metotrexate estava em doses progressivamente mais abaixas, sendo interrompido em out/2010. Manteve-se assimtomático e seu último exame, em Jan de 2011 mostrou boa resposta imunológica e supressão virológica (RT-PCR HIV <40 / CD4 596- 26%).
    Ressalto alguns pontos do caso:
    1. Devido ao potencial envolvimento renal nas doenças reumáticas, o TARV inicial foi com AZT. Como apresentou anemia, este foi substituído por TDF. A função renal foi monitorada rigorosamente.
    2. A difícil decisão de iniciar ou não ARV em infecção aguda pelo HIV.
    3. A viragem de PPD após contato com tuberculose e o início de QP logo que afastada a possibilidade de tuberculose em atividade.
    Recomendo a leitura do Consenso do DHHS 2011 acessível em
    http://www.aidsinfo.nih.gov/ContentFiles/AdultandAdolescentGL.pdf.

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