Dividindo as dúvidas e os conhecimentos

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Como não só médicos, mas outros profissionais de saúde estão envolvidos no tratamento dos pacientes portadores de HIV/AIDS, formalmente estão sendo convidados a participar das discussões, enviar casos e dúvidas. Para enviar um caso ou uma dúvida, clique no final de um caso, em comentário, mesmo que não seja diretamente relacionado a ele. Será visto pela adminstradora do blog e será publicado. Se não tiver uma identidade das listadas, publique como anônimo.

Ao publicar este blog minha intenção é criar uma rede de médicos que, por meio da discussão de casos clínicos, possam atender ainda melhor seus pacientes. As dúvidas também podem ser transformadas em situações hipotéticas sobre as quais poderemos debater. Todos os interessados são bem vindos.

30/05/10 Alteração nas postagens:
Ao criar o novo nome para o nosso blog, tive que passar todos os comentários do antigo para cá e por vezes errei, colei 2 vezes ou em lugar errado e tive que apagar. É por isso que está aparecendo que algumas postagens foram excluídas por mim. Pior: não consegui copiar os seguidores para este blog.
Desculpa, mas sou uma blogueira iniciante e errante.
Tânia

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quinta-feira, 31 de março de 2011

Caso 31- Paciente feminina, estável, desenvolveu disfunção renal em uso de TARV

Motivo da discussão:
1- Qual(is) a(s) causa(s) prováveis da IR?

2-Como proceder daqui por diante em relação a controle laboratorial, e medicamentoso tanto da IR quanto da TARV?

3- Para que medidas preventivas contra IRA devemos estar atentos?


Caso:
Paciente feminina, 47 anos. Foi a primeira consulta em 2005. Histórico de início de tratamento em 1996: CD4 inicial 288 CV-10.700 copias. Uso de Tiroxina 100 mg. Sinais de hipertireoidismo (inquietação motora, taquicardia, pele seca). Inicia redução gradual de dose.

História Médica:
• 1996- AZT+3TC+IDV - nefrolitíase bilateral • 2000-AZT+3TC+NVP: elevação de enzimas hepáticas - EFV: intolerância

•Nov 2003: Incluída no estudo BMS045: ATV/r +DDI+3TC)

• Queixas de de ganho ponderal (6 Kg após entrar estudo), aumento vol. abdominal e redução gordura MMII.
• CD4=1004 células/mm3, CV<50 cps. Trocado DDI por AZT (2005)

• Out 2005: CD4=872 CV<40 cps.
• Col. Total=249; LDL=158 Trigl-198.

• Orientada a fazer dieta + ativ. física

• Mai 2006: CT-253 LDL-159, HDL-49, Trigl-225
• CV<40 cps, CD4-968

• Mar 2007- CV<50 cps, CD4-915
• Col T-266 LDL-159 HDL-59

• Jul 2008- CV<50 CD4-861, CT-233, HDL-40 LDL-165 TG-139.

Acentuação da lipoatrofia (facial e apendicular).
Trocado AZT por TDF.

• Creat-1,1; Cl. Creatinina (C-G): 67ml/min

• Jul 2009 – CV<50, CD4- 525
• Col T- 223, HDL - 40 LDL- 147 Trigl- 187.
• Creat.- 1,6; Cl. Creatinina estimado : 46 ml/min

• Set 2009: Creat-1,7 Cl. Creat.- 34 ml/min.
• Col T-198 HDL-40 LDL-129 Trigl-142.
• S. urina - proteinúria ++.

9 comentários:

  1. Antigamente o foco era em manter o paciente vivo, melhorar a resposta imune, suprimir a replicaçào viral. Conseguimos. Agora temos que resolver os problemas que se seguiram.Reparem que desde o início do tratamento, efeitos adversos foram complicadores. O Indinavir provolcou nefrolitíase. Não sabemos se aí já houve algúm grau de compromentimento da função renal. O uso da NVP provocou alterações da função hepática e o EFV também provocou intolerância. Foi inchuída no BMS 045 e aí já apareceu lipodistrofia. Agora sabemos também que o ATV também pode provocar o aparecimento de cálculos da própria medicação, embora em frequencia menos comum do que ocorria com o IDV.Apesar da substituição do ddI por AZT a lipodistrofia evoluiu, acompanhada por dislipidemia. O TDF poderia ser uma ótima solução e foi inciado. Está com alteração da função renal e com proteinúria.Não sei se o clearance já era de 67 na época que iniciou o TDF. Agora acho que é necessário investigar causas de IR antes de culpar o TDF. Lembro que o uso concomitante de ATV/r e TDF aumenta em 41% o risco anual de desenvolvimento de lesão renal. Agora vou esperar o comentário de vocês antes de continuar.

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  2. Tania,

    Neste caso, parece haver uma relação temporal bastante significativa entre o início do TDF no esquema ARV e o declínio da função renal, com o surgimento de proteinúria (embora não disponha de resultados de urinálises anteriores). Mesmo assim, precisamos de alguns exames complementares para definirmos se a causa dessa proteinúria/disfunção renal é de origem tubular, o que corrobora nossa suspeita de causalidade do TDF. Para dar início à nossa discussão de caso, minhas sugestões são as seguintes:
    Sangue:
    • Fosfato sérico, para pesquisa de hipofosfatemia; demais eletrólitos – sobretudo Potássio e Cálcio, no contexto de disfunção renal moderada/grave – também devem ser dosados;
    • Glicemia de Jejum, Hemoglobina Glicada, TTOG – a paciente em questão já apresenta distúrbios metabólicos que ainda não fecham o diagnóstico de Síndrome Metabólica (dislipidemia, lipodistrofia); por esse motivo, vale a pena investigar a presença de outras alterações metabólicas não diagnosticadas/tratadas, como a resistência insulínica e o DM. É sabido que a disfunção tubular induzida pelo TDF é mais freqüente em pacientes com doenças renais de base, como aquela relacionada ao DM, o que aliás também pode cursar com proteinúria;
    • Acho que vale a pena também dosar o paratormônio desta paciente, pois ela já tem uma história prévia de doença tireoidiana (autoimune?).

    Urina:

    • Urina de 24 horas, com pesquisa de : Clearance (real) de creatinina, proteinúria/24h, fração excretada de fósforo e cálcio urinário; a relação albumina/creatinina para pesquisa de microalbuminúria também pode ser realizada, mas a meu ver tem pouco valor nesse caso, uma vez que o EAS já mostra proteinúria ++;
    • Eletroforese de proteínas urinárias, que pode auxiliar na possível etiologia tubular.

    Imagem:

    • Ultrassonografia renal e de vias urinárias: lembrar que temos uma paciente com HPP de nefrolitíase com IDV (o que não afasta doença calculosa de outra etiologia) e com fator de risco para outras doenças metabólicas, como o DM;
    • Ecodoppler de artérias renais: a paciente possui dislipidemia de longa data, com predomínio de hipercolesterolemia não tratada até o momento deste relato de caso. Vale a pena investigar doença obstrutiva ateromatosa de artérias renais, que pode estar contribuindo para a perda progressiva da função renal.



    Com relação às terapias, minha tendência inicial e imediata seria a seguinte:

    • Suspender TDF e ver se as alterações descritas revertem após sua suspensão. Coloco em discussão a necessidade real – e não convencional - de se colocar uma 3ª droga neste caso, no lugar do TDF. Não acho que valha a pena retornar com AZT, ddI ou ainda d4T pelos motivos óbvios (dislipidemia, lipodistrofia). O ABC até seria uma opção de NRTI substituto, mas por que não manter apenas o 3TC (em dose ajustada pelo ClCreat) e o ATV/r? Temos uma paciente com ótima adesão, sem história prévia de falha terapêutica e com esquema atual contendo IP/r. Os estudos de simplificação de esquema para monoterapia com IP/r (LPV/r, ATV/r) naqueles pacientes com boa adesão e com CV <50 mostraram sustentabilidade da resposta virológica, sem prejuízo para o paciente...
    • Raltegravir ou Maraviroque também poderiam compor o esquema como 3ª droga junto com 3TC + ATV/r, mas esbarraríamos em questões logísticas: RAL só está liberado a priori para compor esquemas de resgate (o que não é o caso) e Maraviroque, além da necessidade de se ter um teste de tropismo mostrando tropotipo R5 (Obs: paciente com CV < 50, o que pode falsear resultados), não está incluído na lista de ARV disponíveis na Rede atualmente;
    • Iniciar IECA, visando seu efeito protetor renal na presença de proteinúria;
    • Tratar a hipercolesterolemia com início de Atorvastatina ou Rosuvastatina, preferencialmente. Outra opção seria a Pravastatina, embora os estudos mais recentes tenham mostrado sua inferioridade em relação às anteriores.

    Bjs,

    Márcio Fernandes.

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  3. Set 2009:
    Creat-1,7 Cl. Creat.- 34 ml/min.
    CT-198 HDL-40 LDL-129 Trigl-142. s. urina - proteinúria ++. Troca de TDF por ABC. Solicitada proteinúria 24 h.

    Out 2009:
    Prot. 24 h: 345 mg, Cl creat: 40 ml/min;
    US vias urinárias: diminuição vol. rim D, com lobulações sugerindo doença parenquimatosa crônica. Falta ABC na rede!

    Jan 2010 – Ainda sem ABC.
    Simplificada terapia para ATV/r.
    Abr 2010 – CD4-997 CV<50 cps, Creat-1,0
    CT-198 LDL-129 HDL-40 TG-142

    Ago 2010 – CD4-970 CV<50,
    Cl. Creat- 67ml/min, Creat.-0,8,
    CT-242, HDL-51, LDL-161 TG-149.
    Ganho ponderal expressivo (+ 8 Kg) .

    DMO - osteopenia.
    T4 livre ↓; TSH ↑=>Reintroduzo Tiroxina 25 mg.
    Vit. D 20-OH: insuficiente (22 UI/Ml). Reposição de Ca e Vit.D.

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  4. Márcio:
    Acho que quase tudo o que você sugeriu foi feito.
    A causa provável da disfunção renal era mesmo o TDF e a retirada dele do esquema já reverteu o quadro. Não sei se o 3TC foi retirado do esquema e em que momento, mas, no final ela ficou com monoterapia com ATV/r. Provavelmente ela tem a protease limpa mas confesso que me causaria um certo desconforto deixar um paciente em monoterapia com IP/r e, ppte porque a paciente que já usou IP sem booster.
    O Us já mostrava sinais de doençca parenquimatosa crônica. Este rim tem que ser muito bem tratado. É importante monitorar muito de perto porque a EuroSida mostrou relação importante do ATV com insuficiência renal, independente do TDF.
    Só tem a proteinúria até set/2009 e nesta ocasião, está levemente alterada (normal em repouso até 140 e com atividade normal até 300. Se manteve a proteinúria eu concordo com vc no que diz respeito ao uso de IECA.
    Concordo também em relação ao uso de estatina, mas, eu daria preferência a rosuvastatina. É preciso lembrar que, por vezes, a correção do hipotireoidismo normaliza o distúrbio lipídico. Taçvez valesse a pena reavaliar um tempo após a reintrodução da levotiroxina.
    Eu também pediria PTH.

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  5. PTH estava normal, a proteinúria se normalizou, não está usando IECA. Ganhou muito peso (ansiedade!!) e voltou a usar tiroxina.

    Carlos

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  6. Boa noite todos:
    Este caso foi apresentado numa aula do Carlos Brites que gentilmente cedeu para o grupo. Vou tentar colar aqui, mas, de qualquer modo, mando por e-mail para o grupo. Vocês vão encontar as referências. Está muito didática.

    Estimando a GFR a partir da creatinina sérica
    Cockcroft-Gault1
    Avaliado a partir de 249 pacientes masculinos, hospitalisados
    Referencial GFR : clearance urinário de creatinina em 24 h
    Ajuste posterior para sexo feminino
    Equação:
    (1.23*(140-idade) *peso(kg)* (0.85 se sexo feminino))/creat (µmol/l)

    MDRD2
    Avaliado em 1,628 pacientes com DRC (GFR 20-60 ml/min/1.73m2)
    Referencial GFR : clearance iothalamate
    2 variaveis eliminadas (“MDRD abreviado”)
    Equação:
    GFR (mL/min/1.73 m2) =
    186 x (creatinina/88.1 (µmol/l))-1.154 x (idade)- 0.203 (x 0.742 se sexo feminino) x 1.21 se Afro-Caribenho
    Referâncias:
    Cockcroft DW, Gault MH Nephron 1976;16:31-343.
    Levey AS et al. Ann Intern Med 1999;130:461-470
    3. Gupta SK et al. Clin Infect Dis 2005:40:1559-85

    Doença Renal Aguda
    Etapas para a Prevenção
    Identificar os fatores de risco (CD4 baixo, Hep. C, etc)
    Manejo adequado de sódio e líquidos
    Tratamento precoce e agressivo da sepse
    Uso parcimonioso de drogas nefrotóxicas (AINH, aminoglicosídeos)
    Parâmetros de Avaliação
    Proteinúria
    Glomerular
    Aumento da albumina
    HIVAN
    Hipertensão
    Nefropatia diabética
    Glomerulonefrite
    Tubular
    Ausência de Albumina
    Droga indutora de dano tubular

    Hipofosfatemia
    Grau 1 0.64-0.77 mmol/l
    Se urina normal, nada a fazer
    Grau 2 0.47-0.63 mmol/l
    Excluir síndrome de Fanconi
    Grau 3 0.32-0.46 mmol/l
    Considerar S. Fanconi e parar o TDF
    Grau 4 <0.32 mmol/l
    Igualmente, mas muito raro

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  7. Continuando a aula do Carlos Brites

    Tenofovir e Eventos Renais na Coorte do CDC
    Estudo Longitudinal da CDC Adult/Adolescent Spectrum of HIV Disease Cohort (N = 11,362)
    Inclusão: TFG ≥ 90 mL/min
    Insuficiência Renal, se presente, determinada pelo calculo da TFG e classificada como leve (TFG 60-89 mL/min), moderada (TFG 30-59 mL/min), ou severa (GFR < 30 mL/min)
    Pessoas tomando TDF maior probabilidade de insuficiência renal que os que não usaram TDF (odds ratio, 1.6; 95% CI, 1.5-1.8)
    Em analise multivariata separada, TDF associado com disfunção leve ou moderada, mas não severa
    Problema: Coorte Observacional, não estudo randomizado
    Usuários de TDF podem ter tido doença mais avançada/progressiva ou maior exposição a nephrotoxinas que aqueles usando outros NRTIs.
    Heffelfinger J, et al. CROI 2006. Abstract779)

    Exosição Cumulativa a ARV e Risco de Doença Renal Crônica no EuroSIDA
    6843 pcts infectados pelo HIV com ≥ 3 medidas de creatinina sérica e medidas correspondentes de peso corporal do estudo EuroSIDA
    21,482 pt-yrs follow-up
    Exposição Cumulativa a TDF, ATV, LPV/RTV, ou IDV associada com risco aumentado de DRC
    Risco de DRC após interrupção do TDF permaneceu elevado por 1 ano
    Em12 meses: IRR 4.05 (2.51-6.53)
    Após12 meses: IRR 1.12 (0.63-1.99)
    Risco de DRC após interrupção de ATV ou LPV/RTV similar a pcts nunca expostos
    Kirk O, et al. CROI 2010. Abstract 107LB.

    Estudos de Monoterapia com IP/r
    LPV/r
    Naive - IMANI I, II / MONARK
    Induction-maintenance - M0-613
    Simplification- OK pilot / OK04 /KALMO / IMANI III / SARA*

    ATV/r
    Simplification- ACTG 5201 / ATARITMO Karlström et al OREY

    DRV/r
    MONOI / MONET

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  8. Continuando a aula do Carlos Brites
    Guidelines
    EACS 2009[1] - Monoterapia com IP/r com LPV/RTV 2x/d, ou DRV/RTV 1x/d pode ser uma opção em pacientes com intolerância a ITRNs ou como simplificação de tratamento.

    IAS-USA 2010[2] - Monoterapia com IP/r não é recomendada exceto em circunstâncias excepcionais quando outras drogas não podem ser consideradas por razões de toxicidade/tolerabilidade.

    DHHS 2009[3] - Monoterapia com IP/r como início ou como simplificação de tratamento tem sido em geral menos efetiva em atingir completa supressão virológica e em evitar resistência. Portanto, esta estratégia não pode ser recomendada na atualidade.

    1. EACS guidelines version 5.2, 2009.
    2. Thompson MA, et al. JAMA. 2010;304;321-333. 3. DHHS guidelines, 2009.

    Em que situações monoterapia com IP/r pode ser considerada segura?
    Em pacientes virologicamente suprimidos (tanto em uso de esquemas baseados em IP-r ou ITRNNs)
    Sem história de falha prévia aos IPs
    Sem histórico de encefalopatia pelo HIV
    Ausência de coinfecção pelo HBV (ou outras condições nas quais ITRNs sejam essenciais à terapia)
    Pacientes capazes de tolerar baixas doses de rtv
    Histórico de adesão ótima
    Nadir CD4+ > 100 cels/mm³[1-3] ou CV HIV-1 < 105 copias/mL[4]

    1. Pulido F, et al. Antivir Ther. 2009;14:195-201.
    2. Campo R, et al. CROI 2007. Abstract 514 .
    3. Gutmann C, et al. AIDS. 2010;24:2347-2354. 4. Katlama C, et al. AIDS. 2010;24:2365-2374.

    Gráficos e tabelas que não consgui colocar aqui estou mandando por e-mail.
    Bj
    Tânia

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  9. Notícias do caso:
    Tania, a paciente do meu caso (lesão renal com ATZ/r+TDF, mudança para ATV/r monoterapia) encontra-se muito bem, com CD4 em maio igual a 1280 cels/mm3, e CV<50 cópias. A creatinina caiu para 1,0 mg/dl, e o clearance estimado está em 68 ml/min. Os níveis de vit. D estão acima de 30 ng. Sem qualquer intercorrência no período.
    abçs
    Brites

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