Motivo da discussão:
Paciente ainda na fase de infecção precoce
pelo HIV (maio-2014), que é considerada até 6 meses de aquisição da
infecção, mas não mais na fase aguda. Imunidade adaptativa e reservatórios já
instalados.
O benefício de iniciar TARV nessa fase superariam os custos
de uma toxicidade cumulativa?
Caso clínico:
Pc. feminina, 52 anos, iniciou, dia 24/03/14, com adinamia
intensa, mialgia, poliartralgia agudizada, náuseas, vômitos, dor em ambos olhos,
hiporexia, inflamação na garganta e tosse não produtiva. Relata ter apresentado
febre baixa (até 38,7ºC), aferida irregularmente, por cerca de 10 dias. No
4º-5º dia de início dos sintomas, surgiu exantema maculopapular eritematoso difuso e não
pruriginoso. Teve uma avaliação médica nessa fase exantemática. Em 16/04,
avaliada por infectologista, queixando-se apenas de adinamia e hiporexia e já sem
anormalidades no exame físico, exceto conjuntivas levemente hipocoradas.
Em 31/0314: VDRL, FAN, IgG e IgM para dengue e Epstein barr,
IgM para CMV, anti-HCV, anti-corpo
anti-Ro (SSA) e anti-La (SSB) não reagentes ; IgG+ para CMV, prot. C reativa
normal, TGP-34, hemograma sem anormalidades, VHS- 8 mm em 60 min.; EAS: Hb-+, hemácias- 4/c, piócitos- 8/c
Em 06/04/14: hemograma: Hb-10,4, Htc.-31%, leucócitos-6.200
(eram 5.510) com bt-3/sg-36/linf-56/mon-5 e 10% de linfócitos atípicos,
plaquetas-183.00 (eram 234.000), TGP-20, TGO-32, gamaGT-74, FA normal, Bbs
normais e anti-HIV (EIE) reagente.
Em 16/04/14: anti-HIV – triagem reagente (EIE - Kit Murex Ag/Ab HIV combinado da Abbott e
imunoensaio de micropartículas por quimioluminescência – Kit HIV Ag/Ab COMBO
Architet System da Abbott) e Immunoblot rápido DPP HIV 1/2 (Bio Manguinhos) indeterminado, bandas reagentes GP41 e
P24, bandas pesquisadas HIV-1: gp120, gp160, gp41 e p24; do HIV-2: gp36
Obs: Ambos testes de triagem apresentaram títulos bem
elevados e bastante superiores ao cut-off.
Em 06/05/14: teste de triagem para anti-HIV reagente (EIE), imunoblot indeterminado evidenciando as mesmas
bandas e western blot reagente.
Apenas o 1º teste de triagem para anti-HIV não foi realizado
no LACEN.
Em 12/04/14: CV-HIV- 7.986, log-3,902, CD4-652 (35%)
Seu atual parceiro, com quem está há dois anos, revelou seu
diagnóstico de HIV+ durante a investigação diagnóstica da paciente. Trata-se de
um indivíduo que não aderiu ao tratamento e que teve, em 12/04/14, CD4-88 e CV
de quase 60.000 cópias/ml.
Tabela 4 – Classificação de Fiebig para Estagiamento Laboratorial da Infecção pelo HIV.
Tabela 4 – Classificação de Fiebig para Estagiamento Laboratorial da Infecção pelo HIV.
Eu tenho a mesma ansiedade que vocês nestes casos no momento atual por causa dos resultados dos casos da coorte Visconti. Dá muita vontade de sair tratando, embora a esta altura esta paciente já tenha povoado os reservatórios latentes. Ela não preenche as indicações de tratamento para infecção aguda agora, mas pode se enquadrar nas atuais recomendações de tratar com qualquer CD4, e estar acima de 50 anos de idade. Depende mais de sua capacidade de adesão e aceitabilidade do tratamento, como vc já disse. Eu, à princípio, trataria.
ResponderExcluirEu também sempre tento, embora, como no caso descrito, os exames costumem demorar demais para caracterizar a plena fase aguda quando o/a paciente chega.
ResponderExcluirMuitos pacientes também hesitam, pedem um tempo pra pensar e perdem mais tempo ainda.
Impressiona o peso, compreensível, do medo das alterações da imagem corporal.
Jacqueline
Tania:
ResponderExcluirBoa tarde.
A orientação atual é tratar a todos, independente de parâmetros laboratoriais (CD4 e CV).
Tenho pacientes com carga viral mantida há alguns anos < 3 log.
Numa destas, antes de iniciar a TARV solicitei a genotipagem.
O convênio pediu para “justificar de acordo com as diretrizes do MS”.
Óbvio que o caso não se enquadra e vou pedir à paciente para tentar fazer particular.
Porque acho particularmente importante neste caso?
Se a amostra for resistente a ITRNN e eu tratar com TDF 3TC EFV, a terapia dupla vai dar conta da carga viral, pelo menos por um tempo.
Lembra as nossas antigas diretrizes brasileiras?
O que vc acha? tratar sistematicamente com IP (resistência rara) e expor a paciente aos efeitos adversos de um lopina sem necessidade?
Jacqueline
Eu acho que todos deveria fazer genotipagem pré-tratamento, em especial onde a prevalência de resistência adquirida é de intermediária (5 a 15%)a elevada (>15%). Na nossa região ela é intermediária. Eu entendo que os convênios devam ter que pagar, assim como o governo e a indicação é a suspeita de resistência adquirida. Não começaria com IP/r.
ResponderExcluirOi Tânia:
ResponderExcluirO MS já incentiva o diagnóstico da infecção aguda pelo HIV, permitindo a pesquisa de RNA precocemente nos casos suspeitos de infecção aguda. Diante do quadro clínico e da epidemiologia (o parceiro somente revelou ser HIV+ depois e realização de dois testes rápidos que foram reagentes para anti-HIV), foi solicitada a CV.
Acho que a paciente estaria pronta para iniciar iniciar TARV.
Parece-me que os testes de triagem do LACEN são de 4ª geração porque pesquisam Ag/Ac. Buscarei essa confirmação na próxima semana.
Um grande abraço,
Myriam
Colei a tabela do Manual referido acima no caso e aqui está o link para o acesso
ResponderExcluirhttp://www.sbac.org.br/consulta_processual/manual_tecnico_hiv.pdf
Definições DHHS - 2014
ResponderExcluirInfecção aguda- é a fase logo após a infecção pelo HIV, quando ocorre a explosão da viremia. Nesta fase, o anti HIV está negativo, enquanto o RNA HIV e o antígeno p24 estão presentes. Já infecção recente é considerada até 6 meses após a infecção e os anticorpos são detectados.
40 a 90% dos pacientes com infecção aguda vão ter sintomas de síndrome retroviral aguda caracterizada por febre, linfoadenopatia, faringite, rash cutâneo, mialgia, artralgia e outros. Pode ser também assintomática.
Situações para consideração de tratamento nesta população:
- Todos os pacientes infectados pelo HIV, mesmo os com infecção recente (BII), embora não haja dados que demonstrem se esta estratégia vai resultar em benefícios virológicos, imunológicos e clínicos em longo prazo.
- Todas as grávidas devem inciar TARV tão cedo quanto possível para evitar transmissão vertical(AI).
- Se a TARV é iniciada na fase recente da infecção, o objetivo é indetectar a CV (AIII).
- CV, CD4 e monotoramento de efeitos tóxicos devem ser feitos do mesmo modo que para pacientes que inciaram TARV na fase de infecção crônica(AII).
- Teste de resistência genotípico deve ser iniciado antes do início do tratamento, para guiar o melhor regime (AII). Se o tratamento é adiado, a genotipagem deve ser realizada mesmo assim porque seu resultado será útil para atingir uma resposta ótima quando o tratameto for iniciado (AII).
- Para paciente sem resistência transmitida, tratamento deve ser o mesmo que o recomendado para pacientes com infecção crônica (AIII).
-TARV pode ser iniciada mesmo antes do resultado da genotipagem. Nesta situação, o esquema a ser utilizado deve ser de um IP/r, porque resistência a IP/r emerge vagarosamente e resistência transmitida a IP/r clicamente significante é incomum, associado a dois ITRN (AIII).
- Pacientes que iniciam tratamento precisam ser capazes de aderir e entender os possíveis benefícios e riscos do tratamento e da importância da adesão (AIII).Os pacientes podem escolher adiar o tratamento e os cuidadores devem avaliar caso a caso adiar o tratamento por causas clínicas ou psicossociais.
Ranking: A- forte B- Moderada C- opcional
I- Dados de estudos randomizados e controlados
II- Dados de estudos bem desenhados, não randomizados, ou estudos observacionais de coortes com longo tempo de acompanhamento.
III- Opinião de experto
Acesso: http://aidsinfo.nih.gov/contentfiles/lvguidelines/adultandadolescentgl.pdf
Eu sou da opinião de que deveríamos fazer genotipagem pré- tratamento em todas as regiões onde a prevalência de resistência adquirida é de 5 a 15% caracterizando resistência moderada oela OMS e >15%, caracterizando resistência elevada.
ResponderExcluirNa tese de doutoramento da Celina nosso grupo do laboratório de Retrovirologia da UNIFESP estudou a resistência adquirida em cronicamente infectados pelo HIV nas 5 macrorregiões brasileiras. Usamos a metodologia da OMS (este estudo está em análise para publicação). Encontramos na região sudeste uma prevalência de 12,8%, na região sul 9%, na região Central 9%, na região norte 8,5% e na nordeste 19,1%.
O Mauro Treitsman também reuniu os pacientes dele e levantamos os percentual de resistência adquirida. Todos os pacientes eram atendidos na cidade do Rio de Janeiro e encontramos 18% de prevalência de resistência adquirida- apresentamos no infecto Rio 2012.
Não sei porque Dr. Fábio Mesquita falou numa palestra no HIV Américas que a prevalência de resistência adquirida no Brasil era muito baixa, variando de 1 a 2%.
Eu acho que temos que fazer teste de resistência pré-tratamento sim, ainda mais se mantivermos como primeiroa linha EFV, que só precisa de uma mutação para resistência e a K103N é uma mutação de alta prevalência dentre a lista das mutações adquiridas no nosso meio.
E você, também acha que deveríamos fazer teste de resistência pré-tratamento? Quer justificar? Seria legal.
ResponderExcluirConcordo que devemos fazer genotipagem antes de iniciar tratamento. Inclusive, durante o tratamento, caso haja falha, temos como discutir melhor com o paciente as possíveis causas. Como no geral se trata de má adesão mesmo, isso facilita o entendimento do que está acontecendo e a possibilidade de mudança na direção certa. Ana
ResponderExcluirDe acordo com a recepção e percepção do paciente com relação ao tratamento eu iniciaria ou não, mas tentaria iniciar TARV precocemente, em especial pela preocupação com a inflamação crônica e comorbidades. Fiquei com a impressão de que a paciente não tem comorbidades, mas como tem mais de 50 anos, de acordo com a história familiar e outros fatores, pode ter maior risco.
ResponderExcluirLi dois artigos que deixo referenciados no fim do comentário sobre doença cardiovascular, endócrinas e metabólicas como fator de risco para HAND. O mais interessante é que tiveram maior associação com o desfecho do que outros fatores comumente estudados, como CV no líquor por exemplo.
Adoraria pedir genotipagem de entrada também, pois pior do que iniciar EFZ para uma pessoa com mais de 50 anos, alterações de menopausa (ósseo), talvez uma HAS/dislipidemia é começar EFZ para essa mesma pessoa e não estar fazendo efeito.
Abraço.
Rodrigo
McCutchan JA, Marquie-Beck JA, Fitzsimons CA, et al. Role of obesity, metabolic variables, and diabetes in HIV-associated neurocognitive disorder. Neurology 2012; 78: 485–92.
Wright EJ, Grund B, Robertson K, et al. Cardiovascular risk factors associated with lower baseline cognitive performance in
HIV-positive persons. Neurology 2010; 75: 864–73.
Rodrigo: se vc tem os 2 trabalhos em PDF, manda pra mim que eu envio para o grupo.
ResponderExcluirObrigada pelo comentário.
Bj