Motivo da discussão:
1. A que atribuir a queda de CD4 após
anos de recuperação imunológica?
2. Que medidas terapêuticas poderiam ser
tomadas com o objetivo de tentar aumentar o CD4?
Masculino,
43 anos, anti-HIV reator em JUL/1999, com critérios laboratoriais de SIDA já
por ocasião do diagnóstico (CD4+ 69 cél/mm³ em NOV/1999). Anti-HIV não reator
realizado em FEV/1999, quando apresentou Herpes Zoster. Nunca apresentou
nenhuma doença definidora de SIDA.
Histórico de TARV:
·
15/DEZ/99:
AZT + ddI + NVP à Início de TARV, com CD4+ 69/mm³ e CV
360.000 cp/ml; apresentou apenas uma CV < 80 cp/ml em MAI/00, seguida de 490
cp/ml em NOV/00 e 5.400 cp/ml em ABR/01.
·
05/JUL/01:
d4T + 3TC + NFV à Troca por falha virológica (CD4+
200/mm³ e CV 5.400 cp/ml); evoluiu com ótima resposta virológica após a troca
do esquema, mantendo CV < limite mínimo desde então. As trocas subsequentes
no esquema ARV se deram apenas por motivo de redução na toxicidade.
·
24/JUN/05:
AZT/3TC + NFV à Paciente apresentando dislipidemia
mista. Exames por ocasião da troca mostrando CD4+ 545/mm³ e CV < 80 cp/ml.
Exames anteriores mostrando:
Data
|
CD4/CD8
|
CV cp/ml
|
Esquema ARV em uso/Observações
|
17/4/01
|
200 / 1086
|
5.400
|
Vinha em uso de AZT + ddI + NVP
desde DEZ/99 à Trocado para d4T + 3TC + NFV em
05/JUL/01.
|
06/11/01
|
311 / 1308
|
1.200
|
d4T + 3TC + NFV
|
28/5/02
|
449 / 2000
|
-
|
d4T + 3TC + NFV
|
17/9/02
|
373 / 1722
|
< 80
|
d4T + 3TC + NFV
|
25/6/03
|
430 / 1422
|
-
|
d4T + 3TC + NFV
|
22/9/03
|
525 / 2000
|
< 80
|
d4T + 3TC + NFV
|
10/2/04
|
487 / 1759
|
< 80
|
d4T + 3TC + NFV
|
08/6/04
|
610 / 1452
|
< 80
|
d4T + 3TC + NFV
|
20/9/04
|
575 / 1728
|
< 80
|
d4T + 3TC + NFV
|
16/5/05
|
545 / 1454
|
< 80
|
d4T + 3TC + NFV à Esquema trocado para AZT/3TC + NFV
em 24/JUN/05, por conta de dislipidemia mista.
|
A partir de JUN/05, quando o d4T foi
substituído pelo AZT no esquema, o paciente começou a apresentar uma queda
significativa na contagem de células CD4+. O Hemograma nunca mostrou sinais de
toxicidade medular pelo AZT, com leucograma sempre na faixa de normalidade
(4.000 – 10.000 leucócitos/mm³) e com percentual de linfócitos sempre acima de
30%.
Data
|
CD4 / CD8
|
CV cp/ml
|
TARV
|
Leucograma e % Linfócitos
|
05/09/05
|
426 /
|
< 80
|
AZT/3TC/NFV
|
8.680/mm³ - 28% linfo (2.430/mm³)
|
06/12/05
|
223
|
230
|
AZT/3TC/NFV
|
7.680/mm³ - 36% linfo (2.764/mm³)
|
20/02/06
|
193
|
< 80
|
AZT/3TC/NFV
|
5.680/mm³ - 39% linfo (2.215/mm³)
|
18/04/06
|
142
|
< 80
|
AZT/3TC/NFV
|
6.940/mm³ - 39% linfo (2.706/mm³)
|
20/DEZ/07: TDF + 3TC + ATV-r à CD4+ 132 (6.9%) e CV < 400
cp/ml em OUT/07, pouco antes da troca de AZT por TDF. O paciente vem em
uso deste esquema desde então, mas nenhuma melhora na contagem de células
CD4+ foi observada. Por conta disso, teve de retornar o uso de SMZ-TMP
profilático (3x/semana). Seus últimos exames de 06/SET/12 mostraram
leucometria global de 7.400/mm³ (23% linfócitos – 1.702/mm³); CD4+ 129
cél/mm³ (7.6%) e CV < 40 cp/ml.
Este é um caso interessante, pois
apesar do paciente já apresentar um dano imunológico significativo por ocasião
de seu diagnóstico (CD4+ 69 cél/mm³ em 1999), ele ainda possuía uma ‘reserva
histológica’ satisfatória, posto que após o início de TARV, seu CD4 chegou a
610 cél/mm³ em 2004. O problema todo, coincidentemente ou não, começou após a troca
do d4T por AZT no esquema, quando então o CD4 começou a despencar. Mais curioso
ainda foi o fato dos hemogramas seriados não mostrarem nenhum sinal de
toxicidade medular em nenhuma das 3 linhagens sanguíneas (eritrócitos,
leucócitos e plaquetas), o que poderia explicar uma possível mielotoxicidade
pelo AZT, o que não foi o caso.
O que existe na literatura sobre dano imunológico irreversível (ou parcialmente reversível) pelo HIV está relacionado histologicamente a um grau elevado de fibrose dos linfonodos, com perda de sua arquitetura e funcionalidade, bem como a uma depleção devastadora de células CD4+ (sobretudo células näive) na submucosa do trato gastrointestinal. Nestes casos, os pacientes tratados com HAART não alcançam ganhos imunológicos significativos, mesmo em uso de TARV por tempo prolongado e com CV indetectável. O caso aqui apresentado mostra um fato inédito, pois o paciente obteve ganho imunológico significativo, mas por algum motivo retrocedeu, apesar de ser jovem (30 anos na ocasião do diagnóstico e início de HAART, atualmente com 43 anos) e ter excelente adesão à TARV, com CV < limite mínimo desde 2002.
ResponderExcluirOutro ponto interessante a ser discutido é se o uso de Maraviroque (MVQ) – que está associado a um maior aumento nas células CD4+, como mostrado nos Estudos MOTIVATE - poderia ser uma ferramenta útil neste caso em particular. Este paciente não tem teste de tropismo, mas tudo indica que seu vírus tenha tropismo CXCR4 (ou “X4”), que está relacionado a uma maior patogenicidade viral e queda mais acentuada de células CD4+. Neste caso, o uso de MVQ no esquema ARV seria de nenhuma valia. Também fala a favor de tropismo X4 o fato dele ter um anti-HIV negativo em FEV/99 e outro positivo em JUL/99, já com CD4+ < 100 cél/mm³, demonstrando progressão acelerada de doença por vírus X4, conforme também mostrado em estudos.
Márcio Fernandes
Oi, TÂNIA
ResponderExcluirA meu ver,
* Mesmo se houvesse mielotoxicidade pelo AZT, representada principalmente por anemia macrocítica, ainda não estaria justificada a queda persistente das células CD4. Eu acredito que foi coincidência.
* Não raro a gente vê pacientes que apresentam resposta terapêutica discrepante, ou seja, piora imunológica c/ supressão viral, provavelmente por incapacidade de manter constante a produção de células CD4 e retorno ao nível pré tratamento, devido a propria ação viral ao longo do tempo. Por outro lado, a troca dos a-retrovirais vigentes deve ser tentada para diminuir o risco de infecções oportunistas e de algumas neoplasias. Sendo assim, eu optaria pela substituição do ATA'r com DRV´r mais RAL.
Bj
Maria Cristina Gama
O diferente neste caso é que ele fica em supressão viral com resposta imunológica sustentada e com CD4 em torno de 500 células/mm3 de setembro de de 2002 a setembro de 2005. Não deveria ter esgotado o pool de CD4 naïve, teoricamente. AZT pode estar associado a falha de resposta imunológica, por toxicidade. Vou estudar mais um pouco o caso. Por enquanto, postei umas referências de resposta discordante e depois vou colocar umas de uso de maraviroque.
ResponderExcluirEm tempo: Como é o CD8 deste paciente? CD8 tem uma função de eliminar células infectadas e assim impedir a produção de novas partículas virais.
ResponderExcluirRecebi resultados de CD8 e acrescentei na talela.
ResponderExcluirNão há uma definição definitiva para falha imunológica, mas esta pode ocorrer pela incapacidade de aumentar as células CD4 ou de sustenta esta elevação.
ResponderExcluirPodem ser fatores associadados a resposta inadequada de TCD4+:
1- CD4 incial <200/mm3
2- Idade avançada
3-Coinfecções (HCV, HIV-2,HTLV-1,HTLV-2
4- Medicações (AZT, TDF+ddI)
5- Ativação imune persistente
6- Perda da capacidade regenerativa do sistema imune.
7- Outras comorbidades.
O que é recomendado é :
A)a revisão cuidadosa de medicações concomitantes com foco nas que sabidamente diminuem leucócitos, especialmente células TCD4+ (quimioterápicos para cancer, interferon, prednisona, AZT, TDF+ddI)
B)considerar substuição destas drogas.
C) Revisão de co-infecções e doenças malígnas.
Manejo:
1- Como a ativação imune ocorre mesmo em pacientes em supressão viral, pode-se tentar adicionar drogas ao regime em uso, mas o benefício ainda não está claro. Também é possível trocar o esquema para outro, como de ITRNN para IP pi esquemas baseados em inibidor de integrase ou antagonista de CCR5, mas também ainda não está bem claro o benefício.
Tratamentos imunológicos como com IL2, hormônio de crescimento, IL7, ciclosporina, ainda estão sob investigação.
A minha sugestão para o caso, afastadas causas medicamentosas e comorbidades seria:
1- Intensificação: se fosse R5, faria maraviroque (os resultados dos trabalhos em relação a ganho de CD4 são controversos, mas há redução da ativação imune . Se fosse X4, acrescentaria RAL.
2- Dosar vit D- vit D baixa pode aumentar a atividade inflamatória.
Vou enviar para todos algumas referências bibliográficas que acho boas de seram lidas.
http://www.aidsinfo.nih.gov/Guidelines/HTML/1/adult-and-adolescent-treatment-guidelines/15/
http://www.clinicaloptions.com/HIV/Conference%20Coverage/Retroviruses%202010/Tracks/Podium/Podium/Pages/Page%2010.aspx
http://jid.oxfordjournals.org/content/early/2012/07/11/infdis.jis376.abstract
meu cd4 vem baixando desde março de 2012 , comecei o tratamento com cd4 266 e chegou a 455 e agora 318 venho perdendo de 50 a 30 células por exame,mais porem o valor absoluto cai e cresce ,hoje 25,69% to preocupado,pois meus linfócitos nunca estiveram ta baixo como esse ultimo exame abril de 2013 18% 1242cel ,porem a quantidade de leucócitos aumentou.Sera que estou caminhado para uma falha imunológica? medicação biovir efavirenz.
ResponderExcluirBom dia: Este blog foi criado para discussão de casos clínicos entre médicos. Não posso, por questões éticas, responder ao seu questionamento. Por favor tire suas dúvidas com o seu médico. Ele poderá discutir com você sua evolução clínica, laboratorial e tratamento. Para pacientes em tratamento, o parâmetro de avaliação de resposta aos antirretrovirais mais importante é a carga viral e não o CD4. Desculpa não poder ajudá-lo mais. Procure seu médico.
ResponderExcluir