1- Apresentar mais um caso de neurossífilis em paciente infectado pelo HIV, VDRL negativo.
2- Você trataria com esquema de segunda linha para evitar hospitalização?
Caso:
Masculino, 27 anos, procurou atendimento dermatológico em agosto 2013 porque estava com "manchas pelo corpo". Nega ter tido qualquer outro sintoma na ocasião ou precedendo o quadro. A colega solicitou exame para sífilis que foi positivo (SIC) e o paciente foi medicado com 2400000 U de penicilina Benzatina.
Nesta ocasião foi pedido anti HIV que foi positivo.
Primeira consulta com o infectologista em 31/10/13- candidíase oral, leucoplaquia pilosa exuberante, máculas hiperpigmentadas nos terços inferiores de ambas as pernas, parecendo corresponder a áreas de cicatrização de prurigo.
Trouxe exames:
29/08/13
FTA-ABS IgM neg FTA- ABS IgG +
23/09/13
Anti HIV + Elisa e WB
Medicado com Fluconazol + SMZ + TMT profilático + Azitromicina profilática e solicitados exames.
Volta a consulta em 14/01/14 sem candidíase oral, com leucoplaquia.
04/11/13 Exames de interesse
VDRL neg
RT-PCR HIV 383058 cp/ml- 5,58 log
CD4 10/mm3 (1%) CD8 549/mme- 57,7% CD4/CD8 0,01
PPD- não reator
Medicado com TDF + 3TC + EFV. Restante mantido.
09/01/14 Há uma semana com cefaléia holocraniana, em geral noturna. Sem febre. Visto pelo oftalmologista que reviu os óculos que deveria usar para corrigir o astigmatismo- estão OK. Decidido que deveria puncionar já que foi tratado para sífilis primária em agosto 2013 e não foi puncionado. Nuca livre. Isocórico e fotorreagente. Sem déficits neurológicos focais.
13/01/14
Líquor
Punção lombar
Pressão inicial- 8 cm água / Final 4 cm água
Volume 10 ml / límpido / incolor
Leuc 54 / Hem 2 / Neutro 1 / eos 0 / linf 88 / mono11
Proteínas 71 (lombar N =40)
Glicose 51 (N40-80)
Bacterioscopia
Flora gram-positiva- ausente
gram- negativa- ausente
BAAR ( Ziel) negativo
Fungos( Nankin) - neg
Látex bact- neg
Látex crypto neg
Cult bactm fungos Bk em andamento
Neurolues:
VDRL: neg
Hemoaglutinação reagente 1/4
FTA-ABS neg
Elisa: reagente
IgG e IgM toxoplasmose negativo- Elisa
Hemoaglutinação toxoplasmose - neg
IgG e IgM HSV neg
IgG CMV + IgM CMV neg
Anti HIV Elisa +
Anti HTLV I/II- não reagente
Índice de IgG 1,01- síntese intratecal de IgG
Internado para fazer Penicilina Cristalina 24 milhões de unidades
Planejada repetir 2400000U Penicilina Benzatina ao final dos 14 dias da Penicilina Cristalina
Cara Dra Tânia, antes de tudo parabéns pelo blog. Fiquei muito feliz quando o descobri. Uma oportunidade ímpar de tirar dúvidas com pessoas fantásticas como vc e as que comentam.
ResponderExcluirEm relação ao presente caso, apesar da minha pouca experiência, não correria o risco de fazer ceftriaxone neste paciente, principalmente por ser HIV positivo com CD4 baixo. A taxa relatada de falência com ceftriaxone, cerca de 23 % nesse artigo clássico (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/1442850) , é significativa, quase 1/4. Este também não mostrou benefício da ceftriaxona: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/7969296.
Este estudo de 2011, por sua vez, mostra efeitos comparáveis da ceftriaxone com a penicilina cristalina (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21463980).
Até hoje tive 2 pacientes com critérios para neurossífilis, nos quais, por alergia presumida a penicilina, optei por fazer ceftriaxone e em um deles houve aumento do VDRL no LCR (claro, não pude afastar reexposição, mas ele me garantiu que não se reexpôs!). É óbvio que esta minúscula casuística não quer dizer nada. rs. Não tenho experiência com despacilina + probenecida.
Enfim, apesar do transtorno e fonte de ansiedade que é para alguns pacientes internar para tratar neurossífilis, eu conversaria com o mesmo sobre a importância do tratamento, solicitaria passagem de cateter central de inserção periférica (PICC) (poupar veias periféricas e menor invasão) e faria pelo menos 10 dias de penicilina cristalina.
Sucesso,
Davi
PS: Espero em breve estar enviando alguns casos.
Respostas sorológicas não usuais são comuns entre pacientes infectados pelo HIV com sífilis. O fenômeno prozona pode ser uma causa de teste não treponêmico falso negativo, geralmente ocorrento durante a sífilis secundária, quando altas concentrações de antígenos treponemicos podem impedir a formação de complexos antígeno/anticorpo detectáveis. A prevalência de neurossífilis em infectados pelo HIV varia de 23 a 40%, equanto que é de 10% em soronegativos para o HIV com sífilis não tratada. Há relatos de que aproximadamente 1/3 do pacientes infectados pelo HIV com sífilis recente tem envolvimento do SNC (Zetola N, Klausner J. Syphilis and HIV infection: na update. Clin Infect Dis 2007;44:1222-8). São vários os relatos de neurossífilis recente entre infectados pelo HIV (MMWR.2007;56:625-8). Ghanem et al Clin Infect Dis 2009;48:816-21) puncionaram 46 pacientes HIV+ com sífilis sem sintomas neurológicos e em 10 casos (22%) foi diagnosticada neurossífilis. Nesta série de casos, os achados mais frequentes foram pleocitose, aumento de proteínas e o VDRL foi positivo em aproximadamente 50% dos casos (baixa sensibilidade, alta especificidade). Demonstraram que CD4 ≤ 350/mm3 e títulos de RPR >1:32 aumentam o riscos de neurossíflis (sensitivity, 100% vs. 80%; specificity, 87% vs. 76% ).
ResponderExcluirEstou mandando para o email de todos diversos artigos selecionados pelo meu grande colaborador, o Márcio Fernandes.
Gostaria que colaborassem com seus comentários.
Tânia
Acredito que o diagnóstico mais provável seja sífilis, até pela história de infecção com VDRL + anterior, mas outras causas de pleocitose e aumento de proteína não podem ser descartadas. Infecções virais (JC vírus, por exemplo) e até Tuberculose podem cursar com estas alterações, mesmo sem sintomatologia detectável, caso estejam em estágio inicial.
ResponderExcluirDe qualquer forma, trataria a sífilis primariamente e repetiria a PL posteriormente para ver se houve melhora dos parâmetros.
Em relação ao tratamento, idealmente acho que o melhor seria Penicilina Cristalina. A grande dificuldade é ter que internar o paciente, o que nem sempre é possível. Alternativamente poderia ser realizado Ceftriaxone que pode ser feito em esquema de hospital-dia ou até intramuscular, mas a resposta é inferior à penicilina. Neste caso, até pela dificuldade em estabelecer um diagnóstico seguro de sífilis, acho mais seguro fazer Penicilina Cristalina para não haver dúvidas quanto à eficácia do tratamento na avaliação posterior.
Alberto Chebabo